quarta-feira, 5 de junho de 2013

     Céu e Inferno

     A utilidade que a procura incondicional da verdade traz é tão constantemente demonstrada ao cêntuplo que é necessário conforma-se sem hesitar com coisas prejudiciais, levianas e raras. Em resumo, com os quais o indivíduo consciente de si pode chegar a sofrer por causa dessa busca.Porém, tal sofrimento gera uma complexa compreensão sobre os desígnios da vida e a função intrínseca que ele gera na formação do caráter de uma pessoa, ativa e desperta sobre as maquinações do mundo.
Dessa forma não se pode dizer de modo algum que temos uma opinião formada sobre tudo ou em caráter concreto e definitivo, afinal não sabemos se temos dentes de serpentes até que alguém coloque o calcanhar sobre nossas cabeças. Sendo assim, sem dúvida, a nossa personalidade é definida muito mais pela ausência de certas experiências do que por aquelas que vivemos.
     O sofrimento pode gerar inúmeros efeitos, sejam eles bons ou horríveis. Isso depende do nível de percepção. Avaliando assim a clausura é como o sol, pois assim como ele a dor tanto vivifica como pode matar, depende da intensidade. E é nessa ponta que entra o idealista, este é incorrigível! Jogue-o para fora do seu céu e com o inferno ele arranja um ideal para si.
Criem-lhe uma decepção e verão que ele não se empenhará com menos ardor em abraçar sua desilusão do que se empenhava a pouco para se revestir de sua esperança.  E é desse status que os “Sísifos” da atualidade são feitos. Sofrimento, decepção, descrença no amor e na esperança, são desses atributos que é feito a nossa pedra que levamos montanha acima todos os dias nos contrafortes de Hades.
Por isso afirmo que da minha parte, a felicidade da minha vida está intimamente ligada ao hábito de sofrer.
     Roubei o fogo dos deuses e agora assim como Perseu que só queria levar a luz ao mundo, sou castigado diariamente tendo meu fígado devorado dia-a-dia pelos abutres do sistema e renovado à noite para ser consumido pelos carniceiros no dia seguinte. Mas a tentativa de trazer a verdade para aqueles que habitam na caverna é em vão. Pobres coitados foram vencidos pelo sono e agora tem horror a tudo que possam despertá-los. Desse modo sobram só os pretendentes a realidade. Esses são aqueles que quando finalmente percebem com que medida e por quanto tempo foram enganados, abraçam por teimosia até mesmo a realidade mais feia, de modo que se nós considerarmos o mundo em seu conjunto é para a realidade que fracassam no decorrer dos séculos os melhores pretendentes, pois são os melhores que foram enganados melhor e por mais tempo, e nisso não há vantagem ou desvantagem, somente consequências específicas do ponto de vista de quem observa. Se olharmos mais a fundo perceberemos que todos os homens são iguais na derrota e no sofrimento. Mergulhados na clausura eles falam o mesmo idioma, mutualizam-se, se solidarizam.
Assim o plebeu compartilha a mesma cama com o rei, o leproso compartilha do mesmo prato do nobre. Já na alegria e no jubilo, cada um é particular no modo de ser e não obstante a alegria, é algo imperfeito e incompleto, pois é subjetiva e insuficiente. O orgulho anda de mãos dadas com a alegria e com o sofrimento.
     Conheço meus defeitos e não me orgulho de nenhum deles, mas convivo bem com cada um, principalmente com o de ser crítico. Acredito que quando a crítica é exclusiva e injusta bem como inteligente, causa para a pessoa que exerce um prazer de tal modo que o mundo deve reconhecimento a essa obra, e a ação de provocar muitas críticas da parte de numerosas pessoas, pois a crítica deixa um rastro brilhante de alegria, de espírito de admiração de ensinamentos, de boas resoluções – O Deus da alegria criou o mal e o medíocre pela mesma razão que levou a criar o bem e o entendimento.
     Nunca fui ingrato a respeito a minha sorte. Injustiçado, talvez. Nunca me importei com a humilhação, tão pouco com o fardo que em meus ombros eu carrego. Mas conheço muitos afortunados que quando encontra em um saco de vantagens que lhe foi oferecido um único grão de desvantagem e humilhação, ainda fazem cara feia apesar da sorte.
Por isso devemos ser eternamente gratos aos demônios que nos cercam, afinal, são estes que nos causam a compreensão sobre as coisas da vida. Ao contrário do que pensam a maioria, Deus e o Demônio são um só; Deus está sempre presente nos momentos ruins de nossas vidas, a ele recorremos nas desgraças vividas. Já nas alegrias, temos como companhia o Diabo por que pouco nos lembramos do criador nesse momento.
Deus é único e a cada defeito humano cria-se um Deus diferente, e toda qualidade e verdade exacerbada originam um novo e poderoso Diabo.
O fraco e o covarde criam um Deus forte e vingativo, já aquele que é escravo dos elogios e do prestígio sempre dá a luz a gênios malignos.
Uma vez que seguem os caminhos adversos, dessa maneira devemos ter consciência que por maior que seja a intensidade e a frequência do nosso prestígio, estamos seguindo o caminho dos outros e não o nosso, e assim ficamos escravos de um Demônio muito peculiar, a vaidade.
Por fim, nós só nos tornamos livres quando deixamos de ser seguidores daqueles que nos seguem. E ao perceber isso, finalmente conseguimos ver o Diabo de braços e abraços com Deus em um romance astral, e por isso eu compreendo que se meus demônios forem embora, os meus anjos também iriam alçar voo.
     Sintetizando, geralmente utilizamos mal aquilo que pagamos muito caro, porque a isso esta ligada a uma lembrança desagradável, e desse modo, levamos dupla desvantagem. No entanto, acho mais conveniente não ser trivial, pois não sou como aqueles que preferem o belo ao útil, se eu fosse um desses seria como a criança que prefere doce ao pão, por se estragar o estômago e por olhar o mundo com desgosto.
E por isso eu acredito viver na terra dos antropófagos, pois nessa solidão, o solitário como eu roí seu coração, já na multidão são todos que o roem, e talvez por isso devesse ficar deitado sem me mexer e pensar pouco. Esse é o remédio mais fácil de encontrar para todas as doenças da alma. E com boa vontade, seu uso se torna a cada hora mais agradável, porque o fato de ter alguns vermes não é argumento contra a maturidade de certos espíritos.
     Por isso em virtude dos fatos mencionados, tudo se deve a cruel invenção do amor (que diga os meus amigos).

Que teu grande amor fez surgir à ideia cruel de destruir o objeto desse amor para subtraí-lo de uma vez por todas do jogo do sacrílego da mudança, afinal, o amor genuíno teme a mudança mais do que a destruição, e é por isso que espero ansioso pelo dia em que finalmente beberei o vinho da vitória ainda que seja na taça da derrota. Irei fazer isso em homenagem a essa força indelével e andrógina que por falta de nome melhor chamarmos de Deus e Demônio.

Autor: Welker Melo e Bruno Siqueira


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